quinta-feira, 5 de novembro de 2009

18ª Croniquice - Os Pobres de Espírito, no AO - 05.11.09


Existem algumas coisas que me irritam profundamente: mulheres que não se cuidam, homens machistas, cãezinhos sonoros, tiques de mania crónica, barulho a altas horas da noite, mas poucas me irritam tanto e de forma tão gravosa como a pobreza de espírito. É que fico assoberbada de uma irritação nervosa tal, que todos os músculos do meu corpo se enrijecem e me impelem à acção. Dão-me ganas de verdadeiro sociopata, que se acha capaz de mudar o mundo “à paulada”! E desculpem a violência das expressões, mas realmente não há nada tão triste e degradante como a pobreza de espírito: mais danosa que a ferrugem nos canos, mais destrutiva que as térmitas nas gavetas e mais passível de nos dar valentes dores de cabeça e corpo do que uma Gripe A. É que os pobres de espírito não se distinguem nem no sexo, nem na idade, nem na classe social, são um género de figuras ridículas, que se passeiam com a inocência culpada dos mais pequenos, juntamente com toda a malícia conscienciosa dos maiores. E os pobres de espírito não são só aqueles que não gostam de ler, de cultura ou de música. Nem sequer são aqueles que não se interessam por política, justiça ou direito social. Eu diria que os pobres de espírito, amibas bípedes sem qualquer noção do ridículo, muitas vezes até se interessam por algumas dessas coisas, com maior ou menor intensidade, mas levam-nas tão a sério como um saco de batatas podres esquecido algures num canto da arrecadação. São pessoas cujos modos vão da prepotência extrema ao desleixe do “quero lá saber”. Pessoas que não tendo a noção daquilo que é viver em sociedade adoptam comportamentos típicos e animalescos de bestas em manadas, ou feras em matilhas, e até essas algumas vezes têm mais ordem e lei.
A pobreza de espírito atira o lixo para o chão, escarra-nos nos tornozelos, passa-nos à frente nas filas e ainda se enche de razão! O Pobre de espírito é aquele puto de brilhante na orelha, que se senta à frente da estação dos correios com um saco de maças na mão, dando-lhe trincadelas de bicho e atirando-as contra os seus clones, que caminham em fila do outro lado da rua encostados às bicicletas. Mas também há muito pobre de espírito, sem brinco na orelha, com ricas contas no banco, esses são aqueles que acham que o mundo é só deles e passam nos seus automóveis topo de gama, num dia de chuva, a alta brida chapinando os transeuntes com as derrapagens que fazem nas poças de água.


E depois há os outros, aqueles que pensam que a vida é o sofá e a mulher o telecomando, de vez em quando, saco de pancada também, quando a programação não lhes agrada. E contra esses, então, vai toda a minha indignação e revolta, contra todos os que acham que a sua própria vida vale mais do que a dos outros. Caros, é como vos digo: “Presunção e água benta, cada um toma a que quer!”. [Parágrafo em Corte Editorial na edição impressa, por falta de espaço em caracteres... é que partilho a página com os comentadores políticos, que têm sempre coisas muito mais importantes para dizer! ;P]