terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Querido, já chega!


Com ar de traquina, pele moreninha, refegos nos braços e nas pernas, marca da sua ainda meninice lá ia ele de banda desenhada debaixo do braço, pacote de bolacha Maria numa mão e noutra um isqueiro escondido, ou talvez uns fósforos, aquilo que apanhasse mais rapidamente na cozinha às escondidas da mãe. O refúgio era sempre o mesmo, um silvado, meio agreste, com um spot muito seu, em género de clareira, mesmo nas traseiras de sua casa. O objectivo era sempre o mesmo: Fumar!
Lá em casa, tudo o que era adulto do sexo masculino fumava. Era para ele como que um ritual de masculinidade, afirmação e prazer, que sempre vem do que é proibido ou interdito. Sentava-se na clareira, comia bolachas e fumava os poucos cigarros que roubava em casa... um ao avô, um ao pai, aos tios, a quem os deixasse esquecidos por tempo suficiente para uma marotice rasteira que ele fazia com tanta doçura!
Devia ter por volta de 10 anos, segundo informação da mãe, quando esta o apanhou, pela primeira vez de calções brancos neste seu espaço, neste seu ritual. Levou-o para casa ao som de uma descompostura, que para além de muito audível foi emitida em vernáculo muito típico do norte do país. Deu-lhe uma tareia com toda a força que tinha e também amor, a que juntou a revolta pelo facto de o seu marido não deixar de fumar, apesar das promessas, do seu sogro não deixar de fumar, apesar das doenças e do seu filho mais velho já se ter iniciado também nesse maldito vício! Ralhou-lhe, ameaçou-o, fez tudo o que o amor lhe ditou e por fim, pediu-lhe... e ele assentiu! Essa foi a primeira vez que ele quebrou essa jura!

“Eu juro, Eu juro que deixo de fumar!”

Agora, muitos anos volvidos, continua a fumar, já tentou e prometeu mais de uma centena de vezes que ia deixar, depois de casarmos, depois de a nossa filha nascer, depois de chegarmos aos Açores, depois de estabilizarmos por cá... e mais recentemente depois de descobrirmos a doença do pai dele, ao que tudo indica, provocada pelo tabaco.

Hoje, a médica do pai dele voltou a dizer-lhe que ele tinha que deixar de fumar... “ Eu sei, mas custa tanto...”, ao que ela lhe respondeu com uma outra pergunta:

“E morrer?! Não custará mais?! E andar em sofrimento para o resto da vida?!”

Meu amor, no que diz respeito à minha resposta e à da tua filha, que não falando ainda o demonstra já bem... a tua falta será a única coisa que nos custará na vida!
Quase em género de pacto com ele, para lhe dar força, prometi que me juntava a ele e deixava de consumir uma ou várias das coisas que mais gosto e de que ele tem conhecimento: chocolate, coca-cola... mas nada...
E ao fim de tantas tentativas falhadas e tantas vezes que cheguei mesmo a acreditar que ele ia conseguir, esta, foi a que mais me custou, porque não quero que ele deixe de fumar, só quando já não o puder mesmo, fisicamente fazer!

Este é o meu último pedido, amor...