quarta-feira, 12 de maio de 2010

Cartas na Mesa...


Eu não sou pessoa de sonhos extravagantes, nem de gostos luxuosos, mas gosto de conforto, de alguma segurança, de certezas e de saber que posso contar minimamente com o que o amanhã trará! Infelizmente, acho que quem pede pouco nesta vida recebe ainda menos e que quem pede muito e faz menos do que nós pedimos, acaba por ser quase sempre bafejado pela sorte dos “loucos”! É a “ironia” do universo!
Vejo muito quem tenha nascido em berço de ouro, mais ainda quem lute todos os dias por singrar e ser alguém! Em várias gerações de mulheres e homens na minha família paterna e materna eu fui a primeira a ser licenciada! A ser “doutora”, como diz a minha avó... e posso dizer, com toda a certeza, que sou a primeira a ter o futuro económico e financeiro mais instável e tremido de todos... isto porque quem estuda até aos vinte e poucos anos tarda em entrar no mercado de trabalho e o curso em que apostou há 5 anos atrás, caduca e expira em 5 minutos, quando as tendências do mercado se voltam para outros lados!
Eu posso dizer que tenho uma licenciatura (não de Bolonha), uma pós-graduação concluída e outra por concluir e que trabalhei 7 anos a recibos verdes para diferentes entidades... que nunca tive um salário fixo acima dos 600 euros por mês e que o primeiro contrato que me fizeram foi numa empresa de construção, onde desempenho funções de “escriturária de 2ª”, em que o salário mal pagaria todas as minhas despesas fixas, sem contar com os extras! Escrevo uma crónica semanal para o jornal, sem remuneração e sou mãe disponível “pro bono”!
Não me levem a mal, portanto, que me sinta revoltada, por ter aprendido latim, alemão, inglês, francês, italiano, russo, espanhol e neerlandês, por ter decorado tudo o que foi feito histórico significativo de 4 países distintos, por ter lido os clássicos gregos e romanos, por ter tido aulas de Literatura Brasileira, orais e marginais, literatura de expressão africana, literatura alemã medieval, por ter decorado o alfabeto fonético e saber transcrevê-lo, por saber a diferença entre fonologia, fonética, semântica, sintaxe e pragmática, por ter aprendido linguística alemã e gramática de valências, técnicas de tradução e didáctica de ensino de português a estrangeiros, escrita criativa e bem sei lá eu mais o quê e agora chegue a casa cansada do tédio profissional de uma função mal remunerada, que nada tem a ver com a minha formação, onde me tratam por “menina”, com o único conforto de que todos os meses o salário me cairá na conta, até ao dia 10! Sabendo que tenho que me dar por feliz por estar a contrato, por ter emprego, por não ter salários em atraso e receber o 13º mês, com direito a férias e tudo...
É triste! Juro-vos, tenho dias em que me deito frustrada e acordo mais frustrada ainda! Tenho dias em que o meu único consolo é a satisfação de saber que o meu carro está podre, mas pago, que a minha casa é humilde, mas limpa e que eu sou mais eu quando não calo, mas grito, ainda que possa ser o maior disparate da minha vida, com toda a certeza de que o mérito do mesmo é todo meu!
E agora digam-me... com que cara querem que eu mande a minha filha “estudar para ser alguém na vida”?! Haja paciência!

Cinderela de pé de chinelo na corda bamba das suas miseráveis ambições...


E eis que o email chegou ontem, a marcar reunião para ontem... no final ficou no ar um telefonema até ao fim do dia de ontem... e eis que até hoje... nada!