terça-feira, 21 de abril de 2009

Anjos Cansados

Na hora em que os anjos se cansam o desânimo é rei. E hoje, tudo em mim é tédio.
Um tédio de sentir as saudades de quem amo e me falta, nos momentos em que os anjos me abandonam à solidão de uma solitária ilha, inundada de casas e pessoas vazias e sorrisos sem significado e palavras mortas presas em lábios roxos, secos de significado e significação.
Na hora em que os anjos se cansam a saudade é rainha. E hoje, tudo em mim é nostalgia.
Uma nostalgia secreta, presa e dominada pela minha força de vontade, mas que não disfarça a lembrança que me ocupa, do meu sítio, casa, amigos, família, cidade e lugares familiares.
O meu Porto, o meu porto seguro, porto de abrigo, o meu pequeno Portus, desta vez sem Calle.
Perdida em viagens, dentro de mim mesma, procurando o porquê deste meu sentir triste e pesado, lembro-me que é possível, que um dia, até mesmo os anjos se cansem.
Não há anjo que aguente o peso de um coração carregado de saudades, e hoje todo o bater do meu são palavras mudas que envio a quem me falta.
Na hora em que os anjos descansam as minhas palavras pesam. Pesam e falham a tradicional alegria que as marca. Marcando a ausência de uma ausência sentida, pesada e pensada, amarrada e obrigada ao exílio de uma ilha familiar.
Ruas e pedras e estradas e campos, vazios. O retrato da minha alma. O reflexo do meu ser e estar.
Não há ausência mais sentida, do que a ausência de nós mesmos. E hoje ausentei-me de mim, juntamente com o meu anjo cansado, na hora em que decidiu descansar! Finalmente sós. Os dois.
Carrego em mim hoje todo o peso de uma falha, falta, ausência, lacuna, vazio. Um deserto abalado pela minha vontade de lhe resistir. Hoje, na hora em que os anjos se cansam, não houve lugar a pensamentos floridos, lugares comuns ou ideias brilhantes. Nesta hora descanso… não é fácil lutar contra um mundo, que não se entende, não se percebe. Não é fácil encontrar justificações constantes para um mundo triste, feio, sujo, sem esperança, corrupto, cruel. Hoje, na hora em que os anjos se cansam trago em mim todo o peso do mundo e de mais dez… o daqueles de quem sinto falta.
Quero sentar-me junto ao meu dourado, verde musgo, rio Douro e sentir-lhe o espírito, a aragem, o aroma pútrido de escoamento de esgotos inundado de tainhas gulosas, que só um tripeiro de nascença sabe ignorar! Sentar-me à beira rio e deixar a hora passar. A hora em que os anjos se cansam. E então, voltar. Voltar à ilha, ao meu lugar de momento, aos meus metros terrenos de isolamento consciente e percorrer de novo todas as suas maravilhas, sem me lembrar das maravilhas que almejava agora percorrer.
A lembrança é fatal na hora em que os anjos se cansam e melhor é pensar, que um anjo qualquer, um não cansado, regresse e decida desta vez não se cansar!
Hoje, nesta hora solitária, desmistifico a vida e limito-me a senti-la, sem choro, sem riso, sem expressão nem desejos. Hoje, na hora em que os anjos se cansam, espero desesperançosa carregando nos ombros o peso de um anjo cansado, que hoje decidiu descansar.

Sem comentários:

Enviar um comentário